Poder público e sociedade debatem recursos hídricos no TCE-GO
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Publicado em 15/06/2023

Tanto quanto a estiagem prolongada e a destruição de nascentes e matas ciliares, o excessivo adensamento urbano é causa de crise hídrica - e de caráter permanente. A afirmação é do advogado Ênio Salviano da Costa, que representou a sociedade civil no diálogo público promovido hoje (14/jun) pelo Tribunal de Contas do Estado de Goiás (TCE-GO), reunindo também representantes da academia, dos órgãos estaduais ligados à gestão ambiental e da própria corte.

O evento, organizado pela Escola Superior de Contas Aélson Nascimento (Escoex) e pela Secretaria de Controle Externo, foi aberto pelo conselheiro Celmar Rech, relator de inspeção recente que tratou dessa temática, e pelo diretor da Escoex, conselheiro Edson Ferrari.

A discussão colaborativa é um dos elementos que permitem ao TCE-GO destacar temas relevantes à comunidade especializada e, também à sociedade em geral, a partir do resultado dos trabalhos de fiscalização desenvolvidos no exercício do controle externo e, de modo semelhante aos desafios enfrentados pelos entes que lidam com recursos públicos, disse o conselheiro Celmar Rech. Ele acrescentou que a formação do Diálogo Público – Recursos Hídricos: Cuidar para não faltar “mostra o acertado passo em direção à construção de um Controle Externo cada vez mais fortalecido e capaz de alcançar com excelência o múnus constitucional, relativo à fiscalização orçamentária, financeira, operacional e patrimonial das estruturas públicas”.

Com o patrocínio de tais discussões, o TCE-GO busca alcançar “a expertise necessária para conduzir ações fiscalizatórias com base em evidências concretas capazes de nortear a adoção de medidas acertadas e passíveis de contribuir para concretização de políticas públicas sólidas, promissoras e sobretudo contemporâneas”, arrematou o conselheiro.

Por sua vez, o conselheiro Edson Ferrari abordou a recente opção dos tribunais de contas em priorizar a avaliação de políticas públicas como forma de induzir a melhoria e maior efetividade da atuação estatal, sobretudo em questões como a primeira infância e a questão ambiental. Ele, que é presidente do Comitê Técnico da Primeira Infância, do Instituto Rui Barbosa, atribui a esses órgãos parte da responsabilidade pelos baixos indicadores da atenção à criança e pela demora em focar sua atuação sobre as respectivas políticas públicas.

O conselheiro também citou o trabalho desenvolvido pelo TCE-GO no campo da sustentabilidade, como o uso de usina fotovoltaica, que lhe dá plena autonomia em energia elétrica, a recuperação de uma área degradada no terreno da sede atual, onde hoje há um bosque com árvores nativas do cerrado, abrigo de pássaros e pequenos animais. Ferrari reforçou as boas vindas às autoridades e especialistas convidados e adiantou que a Escoex vai realizar outros eventos na mesma modalidade, buscando parceria com universidades e outras entidades.

O Diálogo Público de hoje abriu espaço para a Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Semad), a Saneago, o Ministério Público Estadual, a Universidade Federal de Goiás (UFG) e a Delegacia do Meio Ambiente apresentarem as suas ações e contribuições com foco na minimização dos riscos de desabastecimento de água nos períodos de estiagem.

O primeiro painel ficou a cargo de Roberta Tibiriçá e Valter Mário, que expuseram os resultados da inspeção realizada pelo TCE-GO sobre a crise hídrica no Estado de Goiás em 2021, abordando a bacia do Rio Meia Ponte e do Ribeirão Piancó, que abastece a cidade de Anápolis. O trabalho resultou em um acórdão da lavra do conselheiro Celmar Rech onde foram relacionados os principais achados da auditoria e a consequente expedição de determinações e recomendações à Semad e à Saneago, tais como a falta e notificações a todos os detentores de outorgas de uso de água, atraso na instalação do equipamentos de telemetria nos locais de captação de água e insuficiência nas informações que deveriam constar do site do Centro de Monitoramento Hídrico – Cimego.

O  subsecretário de Biodiversidade, Conservação, Segurança Hídrica e Saneamento da Semad,  Jorge Werneck, e Camila Dantas Roncato, superintendente de Meio Ambiente e Recursos Hídricos da Saneago,   falaram sobre as ações desenvolvidas pelos respectivos órgãos, destacando, além dos levantamentos, diagnósticos e fiscalização, ações educativas e de parceria com os produtores rurais que usam sistemas de irrigação e que utilizam áreas lindeiras às nascentes e aos cursos de águas.

O delegado Luziano de Carvalho, desde 2009 à frente da Delegacia do Meio Ambiente (Dema), fez uma defesa apaixonada do cerrado, do rio Araguaia e dos recursos naturais de Goiás, protestando contra a degradação de nascentes, matas ciliares e outras áreas de preservação permanente, de ações irregulares por irrigantes e mostrou, por slides, o antes e depois das atuações da Dema na recuperação de áreas degradadas, com a colaboração de proprietários rurais e de entidades, através do plantio de mudas de árvores, cercamento e manuseio orientado de pastagens. A voçoroca Chitolina, surgida em 2002, e outras nas nascentes do Rio Araguaia foram alguns dos exemplos de recuperação mostrados pelo delegado.

A promotora de Justiça Marta Loyola, representando o Ministério Público, discorreu sobre a atuação no município de Senador Canedo, onde o fenômeno da urbanização acelerada acarretou uma série de problemas ambientais, notadamente a proliferação de loteamentos clandestinos, que não pouparam nem as margens das barragens de abastecimento daquela cidade e outras áreas de proteção permanente. Ela disse que a judicialização dos casos, além de demorada, muitas vezes se revela ineficiente para a solução dos problemas, e, assim, ela buscou junto à Prefeitura, Dema, Polícia Militar, empresas imobiliárias e outros entes sociais em projetos de parceria, como o Consorcio Sul, que resultou em investimentos da ordem de R$ 23 milhões para construção de 12 km de adutora e o atendimento de 100 mil pessoas na região do Parque Morumbi – do Projeto Lote Legal, de combate aos empreendimentos clandestinos.

O geógrafo Elizon Dias Nunes, do Laboratório de Geomorfologia, Pedologia e Geografia, do Instituto de Estudos Socioambientais da UFG,  falou sobre a contribuição da academia, através de pesquisas e outros trabalhos para o mapeamento de nascentes na bacia do Rio Meia Ponte e de impactos da urbanização sobre a permeabilidade do solo em Aparecida de Goiânia, colaborando com o diagnóstico dos problemas junto aos órgãos responsáveis pelo meio ambiente e saneamento.

Os impactos da crise hídrica para a sociedade foram tratados pelo advogado e especialista em Direito Ambiental Ênio Salviano. Ele mostrou que a excessiva e desordenada urbanização é, ao lado das questões tratadas pelos demais painelistas, responsável pela crise hídrica. Alertou para a necessidade de um controle estatal acima dos órgãos ambientais para tratar desse fenômeno que tem levado à estagnação de cidades do oeste do Estado, ou grandes perdas de moradores – Jussara viu minguar 40% de seus habitantes nos últimos 10 anos – atraídos por Goiânia e outras cidades grandes. No caso de Águas Lindas, que era distrito de Santo Antônio do Descoberto, ao emancipar-se, os empresários do setor imobiliário concordaram com a exigência local, que só liberava loteamentos cujos proprietários implantassem abastecimento de água por conta própria. Poços artesianos furados à época forneciam água abundante e de graça à população. A proximidade com Brasília gerou uma avalanche de novos moradores e a água tornou-se insuficiente. O especialista informou que 93% da população de Goiás se concentra nas áreas urbanas, taxa superada apenas pelo Distrito Federal – 100%.

A área da região metropolitana de Goiânia abriga 58% da população do Estado, outro indicativo desse fenômeno que, segundo Ênio, juntamente com os problemas acarretados, dentre eles o abastecimento de água e saneamento, devem ser discutidos também com a participação dos prefeitos.  O diálogo público foi encerrado com um painel sobre o TCE Sustentável, a cargo de seu coordenador, Gilney da Costa Vaz, e com os agradecimentos do TCE-GO aos participantes, da parte do secretário de Controle Externo, Sérvio Túlio Teixeira e Silva.

Confira as fotos do encontro no perfil do TCE-GO no Flickr.

Texto: Antônio Gomes; Fotos: Master Produções

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